Por que respeitar as crianças é tão
importante
Crianças precisam de escuta sensível e
delicadeza no trato. É tudo muito simples se for realmente sincero. Veja
por que amá-las.
Texto por Kátia
Stringueto
Foto de David Lazar
"É
incômodo a gente ser pequeno. As coisas acontecem lá nas alturas, acima de nós.
Talvez seja por isso que gostamos de ficar em pé ao lado dos adultos que estão
sentados. Então, podemos ver os seus olhos.” Janusz Korczak, o maior amigo das
crianças
Os adultos
dizem: ‘Cansa-nos ter de privar com crianças (...). Cansa-nos, porque
precisamos descer ao seu nível de compreensão’. Descer, rebaixar-se,
inclinar-se, ficar curvado. Mas, na verdade, não é isto o que nos cansa, e sim
o fato de termos de elevarnos até alcançar o nível dos sentimentos delas.
Elevar-nos, subir, ficar na ponta dos pés, estender a mão. Para não
machucá-las.”
A ternura no
tratamento à infância foi uma constante na trajetória do pediatra, educador,
escritor e humanista Janusz Korczak. A introdução acima, escrita para seu livro
Quando Eu Voltar a Ser Criança
(Summus editorial) consegue, no entanto, ser ainda mais doce ao exprimir o
cuidado gentil que um adulto precisa ter com a vida que começa. Há mais do que
sensibilidade pura nas suas ideias.
Janusz talvez
tenha sido o maior amigo das crianças, porque soube entrar na fantasia delas,
compreender-lhes a alma e porque nunca as abandonou. Em 1942, mesmo podendo
salvar sua vida, o judeu polonês preferiu permanecer com um grupo de 200 órfãos
retirados do gueto de Varsóvia e encaminhados para o campo de concentração de
Treblinka, onde foram executados pelos nazistas. “É uma história real. Esse
homem ficou com as crianças até o fim – morreu com elas – e poucas pessoas
fariam isso. Além disso, sua obra transborda humanidade.
Pais, jovens,
educadores e cidadãos em geral deveriam ler como uma lição para a vida”, frisa
Cisele Ortiz, psicóloga e coordenadora adjunta do Instituto Avisa lá, de
formação continuada de educadores. “O que nos torna humanos é essa capacidade
de se importar com o outro. E cada criança que amamos é uma oportunidade de nos
redimirmos das nossas falhas e criar um mundo melhor.”
Esse respeito
e carinho começam bem cedo. Há cerca de 60 anos, uma pediatra de Viena chamada
Emmi Pikler defendeu que a criança é competente desde o nascimento. Colocava o
bebê de barriga para cima num ambiente desafiador para ele próprio ir atrás dos
seus interesses, como brinquedos e acessórios atrativos. Por outro lado, quando
a educadora ia trocar ou alimentar a criança, estava 100% voltada para ela.
Diferentemente de um trocador cheio de penduricalhos para chamar a atenção do bebê,
não havia distração. O foco era o que estava acontecendo entre educador e
criança. “A criança ficava tão satisfeita com a presença do educador naquele
tempo de cuidado que depois, quando ia para o chão, permanecia segura.
Por outro
lado, no chão, ao alcançar um objeto que a atraia, ficava feliz da vida. A
confiança vinha dela e da certeza de que, quando preciso, o adulto está lá para
ajudá-la. Estão aí os pilares da famosa autoestima”, diz Cisele. Carinho também
se expressa em momentos singelos, como ao limpar o nariz de um pequeno, ao se
abaixar para ficar no nível dele ou ao dar uma bronca sem ser estúpido – você
deve se lembrar como se sentia quando recebia atenção nessas horas.
Uma cultura que protege
Meninos e
meninas agradecem ainda quando não jogamos o lixo na rua, não furamos a fila,
não brigamos na frente deles e não os humilhamos em público. “Esses seres
hipervulneráveis precisam de proteção, inclusive quando a publicidade se
aproveita da falta de consciência deles para vender algo”, entende a psicóloga
Laís Fontenelle, do Instituto Alana. “Por tudo isso, carecem de um cuidado
maior, uma cultura de proteção. Uma rede de pessoas que olhem ao redor e se
envolvam para evitar qualquer abuso”, diz Ana Maria Drummond, diretor executiva
da Childhood Brasil. Só no país, segundo dados da organização, metade das
crianças residem em casas cuja renda é até meio salário minimo, há 241 rotas de
tráfico infantil e 1.820 pontos vulneráveis à exploração sexual.
E saber que
elas são tão simples e precisam de tão pouco. “Amor, coerência nos acordos,
tempo para brincar”, lembra Renata Meirelles, há mais de um ano viajando com o
marido e os filhos produzindo o documentário Território de Brincar. “Crianças
são caçadoras. Buscam o tempo todo uma sintonia com o universo adulto.
Relacionar-se com elas é como tocar uma música,” aprendeu ela. Quem as escuta
pode dizer que ouve estrelas. Ou conversa com Deus.
Reproduzido
de Casa
Abril via Facebook do Instituto
Alana
27 out 2013
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